Salve-me


Salve-me. É com esse apelo desesperado que começo mais um dia. Não sei bem para quem ou o que direciono meu apelo... Olho em volta e tento analisar as opções: talvez para o sol que apesar de tudo insiste em nascer e devolver as cores que tirei do meu mundo ou para o vento frio que me joga novamente sob as cobertas e elas apenas me acolhem me prendendo em meu sofrimento. Salve-me. Posso parecer insistente mas é o que a necessidade obriga, torço para que o dito seja finalmente ouvido. Salve-me. Apelo mais uma vez e mais uma vez o socorro não vem. Salve-me. E dessa vez escuto em minha própria voz que não existe saída. 



Em um piscar de olhos estou vestida, nem me lembro da água fria do chuveiro ter tocado meu corpo. Outra piscada e estou saindo do trabalho, o que fiz com o meu dia? O que eu fiz no meu dia? Os faróis dos carros do outro lado da janela não me incomodam, muito menos as gotas de chuva que desenham padrões e figuras que apenas eu com minha visão distorcida consigo enxergar. Me mantenho a vislumbrar as gotas caindo  gosto da chuva, ela me acalma e me sinto culpada por usa-la dessa forma. 

Desço do ônibus, ando de cabeça baixa ouço uma buzina ao longe, mas de que importa? Ainda chovia forte e não me dou ao trabalho de pegar um guarda-chuva, para que? Se afinal posso deixar que a chuva lave minha alma e leve para o chão minhas lágrimas. Faróis, buzina, sirenes, falatório... E de repente a chuva para. Olho em volta, afinal a minha frente a chuva castigava o chão e salpicava meu tênis de lama. 

A sombra ao meu lado tinha um braço estendido e em sua mão uma guarda-chuva, ergo a cabeça, mal posso ver seu rosto oculto contra a luz do poste. Volto a abaixar a cabeça e andar, ele continuava ao meu lado me seguindo com o guarda-chuva. Um arrepio percorre meu corpo, apresso o passo, mas ele permanece ao meu lado, estou ofegante e ele, tirando pelas gotas de chuva em seu casaco preto parece impecável. Decido por enfrenta-lo de uma vez, ainda restava muito para chegar em casa e de nada adiantaria fugir. Parei, ergui a cabeça e o encarei, os segundos pareciam uma eternidade, até que ele me estende a mão e ao tocar seus dedos ásperos eu entendo. 

Obedeço ao seu toque, entrelaço meus dedos aos dele e retornamos ao local do nosso encontro caminhando lado a lado, seu toque era frio e reconfortante, senti o calor preencher meu peito a cada passo e acelerar o compasso do meu coração. A chuva não diminuíra  andamos de vagar até chegarmos a uma pequena multidão iluminada por sirenes e faróis  No chão o meu corpo estirado, meus olhos arregalados fitavam o céu cinzento e com um último suspiro meu corpo desistia. Olho para o meu acompanhante e balanço a cabeça de forma afirmativa. Finalmente estou pronta para seguir meu caminho. Ele me carrega e me aconchega em seus braços, fecho os olhos e deixo a paz que apenas a morte pode trazer, me preencher. Finalmente meu apelo fora ouvido.

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